Mais algumas leituras de Agosto
Agosto foi um mês de muito boas leituras. Continuei a minha jornada com Bolaño, o meu para sempre e muito amado autor, é cada vez mais impressionante observá-lo (e acompanhá-lo) nestas aventuras insólitas e emocionantes. Em "2666" a sua disciplina é impressionante. A adrenalina não é tanta como em "Detectives Selvagens" mas há qualquer coisa de viciante, no fundo é como se estivessemos num sonho, ou submersos, e isso fosse a melhor sensação de sempre. Não vale a pena falar do enredo, o melhor é atirarem-se a este livro sem qualquer informação. E o significado de "2666"? Alguém imagina?
"...fantástico, fantástico, a espada do destino corta uma vez mais a cabeça à hidra do acaso."
"Jerusalém" foi o primeiro livro que li de Gonçalo M. Tavares, foi uma leitura que terminei muito rapidamente, e gostei bastante do que li, nota-se que é um autor maduro, sabe o está a fazer, conhece o leitor. O que gostei mais foi do estilo da escrita, há um grande cuidado na escolha das palavras o que nos dá uma sensação de naturalidade, tudo é muito real. As personagens são diferentes do "habitual" e todas elas procuram algo. A sinopse resume bastante bem a essência do livro: uma mulher, um assassino, um médico, um menino, uma prostituta e um louco. E uma noite.
"De repente, uma mulher esquece os acasos que a sua existência guarda num esconderijo e pressupõe que tudo na sua vida individual tem uma participação directa do divino."
"Mrs. Dalloway" mostra-nos quase tudo o que há para mostrar acerca da vida, num único dia, através de uma série de personagens. E consegue fazer isso em cerca de 200 páginas. A escrita é muito rica, densa e envolvente, é como uma manta que nos cobre as pernas numa tarde de inverno. Pensamentos desconcertantes, pensamentos preconceituosos, pensamentos banais, pensamentos turvos ou pensamentos como epifanias. A palavra chave é mesmo pensamento, não fosse Virginia Woolf a pioneira da técnica "stream of conciousness". No entanto, é quase impossível percebermos como é que possível passar tanta informação acerca do passado, presente e futuro destas personagens através de percepções, impressões ou opiniões. Faço uma vénia a Virginia, escritora gigante.
"Tudo lhe parecia inútil - continuar apaixonado; continuar com as discussões; continuar com as reconciliações, e afastou-se sozinho..."
"Dias Perfeitos" foi a minha estreia com Raphael Montes, o jovem autor que é anunciado como a "nova estrela da literatura policial". Mantive-me bastante entusiasmada até meio do livro, a curiosidade por saber o que iria acontecer às personagens compensava os diálogos por vezes um pouco vazios. Mais tarde, senti que o autor enrolou demasiado, deu demasiado espaço a assuntos que já não me traziam curiosidade e o final foi apressado, aconteceu tudo e deixou de fazer muito sentido. A certa altura também fui tomada pela sensação de inverossimilhança, nem sempre "dar voltas e voltas" à situação é a melhor opção na ficção. De qualquer forma, gostei das partes mais macabras e acho que tem potencial de crescimento, é um autor muito jovem e por isso com certeza irá apurando a sua escrita.
"...viajaria com Clarice para Teresópolis, iria conquistá-la aos poucos e - riu do trocadilho - juntos viveriam dias perfeitos."